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ATIVIDADE DE BIBLIOTERAPIA COM USUÁRIOS DOS CENTROS
DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL NA BIBLIOTECA CENTRAL DA UFSC
Ricardo de Lima Chagas (UFSC) - ricochagas@gmail.com
Daniella Câmara Pizarro (UDESC) - daniellapizarro@hotmail.com
Resumo:
Este trabalho tem como objetivo relatar a experiência vivenciada a partir de uma atividade de
biblioterapia realizada na Biblioteca Central da UFSC, com os usuários dos Centros de
Atenção Psicossocial (CAPS) do Município de Florianópolis. Essa atividade foi desenvolvida
por meio da leitura de duas obras pré-selecionadas: “O trem da amizade” de Wolfgang Slawski
e “O menino Nito” de Sonia Rosa. Este relato aponta para a importância da biblioterapia e da
leitura como ações que podem proporcionar a catarse e a liberação de emoções e afetos que
muitas vezes se encontram reprimidos nos sujeitos. A leitura possibilita a abertura de novos
horizontes e permite ao leitor a construção do seu mundo interior como afirmação e
empoderamento. O trabalho mostra, também, a importância das ações entre instituições como
uma maneira de pensar a saúde mental, o direito ao acesso à informação e a construção de
uma sociedade mais equitativa, defendendo a seguinte lógica: ninguém fica para trás.
Palavras-chave: Biblioterapia. Saúde mental. Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).
Biblioteca Central (BC/UFSC).
Eixo temático: Eixo 2: Não devemos deixar ninguém para trás
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�XXVIII Congresso Brasileiro de
Biblioteconomia e Documentação
Vitória, 01 a 04 de outubro de 2019.
INTRODUÇÃO
Mas afinal o que é a biblioterapia? A palavra biblioterapia é composta por dois termos de
origem grega: livro e terapia. Portanto, a biblioterapia é uma forma de terapia por meio de livros ou
materiais de leitura, que tem finalidades terapêuticas em diversos ambientes. Pode-se dizer que essa
técnica situa-se na corrente da hermenêutica existencial com o objetivo de interpretação da vida
enquanto existência (OUAKNIN, 1996). Na ação biblioterápica valoriza-se a subjetividade dos
indivíduos no que se refere à história de vida de cada um, as suas experiências no mundo e as trocas
intersubjetivas entre os participantes do grupo a partir da leitura.
De acordo com Seitz (2006) a biblioterapia no início era voltada para hospitais psiquiátricos
e posteriormente passou a ser utilizada em outras instituições. Atualmente, ela pode ser
desenvolvida em diversos campos de atuação e ser explorada por médicos, psicólogos,
bibliotecários, educadores e outros profissionais. A biblioterapia, de certo modo, pode ser aplicada
no campo correcional, na educação, na medicina, na psiquiatria e com idosos. Portanto, há um vasto
campo de atuação que possibilita profissionais de diversas áreas do conhecimento trabalharem a
literatura como uma ferramenta terapêutica.
A leitura, narrativa ou dramatizada, pode proporcionar a catarse. A catarse é um estado em
que o indivíduo libera emoções à medida que se identifica com as personagens da narrativa. Este
estado de introspecção pode ser o primeiro passo para uma reeducação ou ressignificação das
emoções. Para que o objetivo dessa ação seja atingido, não se deve apenas realizar uma simples
leitura, mas é preciso que haja comentários advindos da leitura associados com a vivência dos
ouvintes. É necessário ouvir o novo contexto criado pelos participantes e valorizar as trocas de
experiência como uma síntese de significações e criação (CALDIN, 2010).
Ainda sobre a importância da leitura, Petit (2008, 2009), afirma que o ato de ler possibilita a
abertura de um novo horizonte, proporcionando um estado de devaneio que permite ao leitor a
�construção de um mundo interior e psíquico, contribuindo, de certa maneira, com o processo de
empoderamento e afirmação do sujeito. A leitura converte-se em um gesto que reforça a
singularidade dos indivíduos, ajudando-os a lidar com as suas próprias questões internas. Isso
mostra a relevância de ações de biblioterapia e de leitura nos diversos espaços sociais e
institucionais como uma forma de promover a saúde mental dos sujeitos e pensar a nossa
responsabilidade social enquanto bibliotecários. Diante do exposto, este relato de experiência tem
como objetivo apresentar a experiência vivenciada a partir de uma atividade de biblioterapia
realizada na Biblioteca Central da Universidade Federal de Santa Catarina (BC/UFSC), com os
usuários dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Município de Florianópolis.
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Antes de detalhar com precisão a atividade de biblioterapia, é necessário pontuar o que
seriam os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Os CAPS são instituições destinadas a acolher
usuários em sofrimento psíquico ou com necessidades decorrentes de usos de substâncias
psicoativas. Essas instituições têm como metas fortalecer os laços afetivos e familiares, estimular a
inserção social dos usuários por meio do trabalho, lazer e exercício dos direitos civis etc. Para suprir
esses objetivos, os CAPS fornecem atendimento médico e psicológico para a comunidade dentro do
território, diferente da lógica manicomial de isolamento (CHAGAS, 2017).
Os CAPS AD Ilha e o CAPS AD Continente do Município de Florianópolis desenvolvem
um projeto intitulado “Trajetos Culturais”. Esse projeto tem como objetivo realizar visitas aos
espaços culturais e públicos da cidade, tais como: museus, cinemas, exposições de arte, órgãos
públicos etc. Os profissionais levam os usuários para conhecerem esses espaços como uma forma
de reinserção social e cultural. Vale pontuar que, por meio da pesquisa “Rede de bibliotecas em
ambientes de saúde mental: um diálogo interdisciplinar” defendida no Programa de Pós-Graduação
em Gestão da Informação da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), detectou-se que
bibliotecas públicas não faziam parte da rota de visitação. A partir dessa investigação, despertou-se
o desejo de conhecerem a Biblioteca Central (BC/UFSC) por meio de uma visita orientada.
A Visita Orientada compõe um dos módulos da Capacitação dos Usuários da Biblioteca da
UFSC. Essa atividade, acompanhada de um profissional bibliotecário, consiste no reconhecimento
dos espaços físicos, apresentação dos serviços informacionais e das normas da instituição, visitação
ao setor da memória da biblioteca e contemplação das exposições montadas em diversos espaços da
�Instituição. Para esse público dos CAPS, além desse roteiro descrito acima, realizou-se a atividade
de biblioterapia com o objetivo de incentivar a leitura, estimular o uso das bibliotecas e trabalhar a
produção subjetiva. A atividade foi realizada na Sala Harry Laus, localizada no andar superior da
Biblioteca Central. Os participantes sentaram-se em círculo e o profissional bibliotecário leu as
duas obras pré-selecionadas para essa atividade: “O trem da amizade” de Wolfgang Slawski e “O
menino Nito” de Sonia Rosa. Para justificar a escolha dessas duas obras literárias e, como uma
maneira de descrever e compreender o conteúdo de caráter subjetivo apresenta-se a seguir uma
pequena sinopse de cada uma delas.
Na obra O trem da amizade, o protagonista chamado Arthur, é um senhor de boné xadrez
que todos os dias, sentado no banco da estação de trem, esperava que alguém viesse visita-lo e, no
entanto, nunca recebia ou despedia-se de alguém. Por isso, ficava triste e cabisbaixo. Ao decidir
entrar em ação, comprou um bilhete e foi até a próxima estação. Conheceu um homem que também
estava só e decidiram ir até a estação seguinte. Os dois, que agora eram amigos, encontraram uma
mulher que também estava à espera de um abraço de alguém. Desta maneira, eles foram criando os
laços afetivos e uma rede de amizade. É possível realizar uma metáfora da viagem do trem com o
próprio fluxo temporal dos indivíduos lançados na vida.
Em O menino Nito, narra-se a história de um menino que chorava por qualquer coisa. Até
que, certo dia, o seu pai o repreendeu severamente dizendo que já estava na hora de parar de chorar,
uma vez que homem que é homem, não chora. Nito, após ouvir esse discurso do seu pai, passou a
prender o choro e parou de chorar. Engolia todos os choros e nenhuma lágrima mais rolou por sua
face. Com os sentimentos reprimidos, passou a ficar triste, não quis mais brincar e ficou até doente.
Era preciso “desachorar” e liberar as emoções. É uma história bela sobre como lidar com os
sentimentos e as emoções.
Após a leitura, dedicou-se um tempo para que o bibliotecário e os participantes dialogassem
e refletissem sobre os assuntos abordados. A leitura das duas obras possibilitou a abertura para
tratar de temas direcionados à subjetividade, tais como: emoções, sentimentos, como lidar com o
sofrimento humano e a necessidade de buscar novos vínculos afetivos com o intuito de promover a
saúde mental. Não foi apenas uma leitura da obra findada em si mesma, mas uma leitura
significativa que possibilitasse a associação do tema de maneira significativa com a vivência dos
participantes. Foi justamente nesse momento das trocas intersubjetivas que os fenômenos psíquicos
foram surgindo mediante a contextualização, lembranças, memórias, metáforas e associação de
ideia, promovendo, desta maneira, a produção da subjetividade.
�Cada participante ficou livre para falar ou apenas para ouvir o discurso dos outros. No
entanto, percebeu-se uma sinergia e uma interação muito positiva no grupo sobre a discussão das
histórias. Muitos associaram alguns trechos da literatura com a própria narrativa da vida pessoal.
Foi um momento importante, singular e riquíssimo de afeto e de sentimento compartilhado.
Surgiram falas como: “Eu me vi nessa história”, “Eu já passei por situação semelhante” ou “Essa
história me fez refletir sobre a minha vida” etc. A trama dos protagonistas das duas obras, Arthur e
Nito, foi inspiradora para que fenômenos psíquicos fossem aflorados e houvesse a participação e
interação durante a atividade.
Após esse primeiro momento de diálogo, iniciamos um segundo instante em que foi
distribuído um material impresso intitulado “Como lidar com seus sentimentos”. Esse material foi
elaborado com antecedência a partir de uma reportagem disponível sobre essa temática no site
“Wikihow”. Foram listados alguns temas de como lidar com as próprias emoções, afinal, as
emoções e os afetos transcendem a lógica da razão humana. Esse momento foi significativo para
mostrar aos usuários dos CAPS sobre a importância da produção subjetiva e a necessidade de
refletir, pensar e ressignificar a própria vida a partir do autoconhecimento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dessa atividade, constou-se que a biblioterapia é uma atividade importante que pode
ser aplicada por profissionais de diversos campos de atuação com o objetivo de promover o bemestar e a produção subjetiva dos participantes. A leitura, a narração e a dramatização de obras
literárias, podem proporcionar a catarse nos sujeitos como um estado importante para liberação de
emoções e afetos que muitas vezes encontram-se reprimidos. A introspecção e a reflexão propiciam
a reeducação e a ressignificação dos sofrimentos psíquicos.
A atividade desenvolvida foi agendada a partir da percepção da necessidade de inclusão das
bibliotecas na rota do projeto “Trajetos Culturais”, que visitam espaços públicos e culturais da
cidade. Quanto a essa lacuna, coloca-se a seguinte questão: por que as bibliotecas não faziam parte
da rota desse projeto? Essa é uma reflexão que se pode lançar como uma maneira de repensar,
enquanto profissionais bibliotecários, a nossa missão social e a representatividade das instituições
bibliotecas junto à sociedade. Outro fator importante é apontar que as universidades e as bibliotecas
universitárias não podem fechar-se em si mesmas. Elas podem estar abertas não apenas para a sua
comunidade específica, mas pode fazer sentido para além dos seus campi.
�Pontua-se também que, por meio da pesquisa “Rede de bibliotecas em ambientes de saúde
mental”, estudo acima citado, detectou-se que cada CAPS têm pequenos acervos de livros, mas que
não possuem bibliotecas estruturadas e nem profissionais bibliotecários atuando nesses espaços.
Percebeu-se que, os CAPS seriam nichos importantes que poderiam ser ocupados por profissionais
da informação para a promoção da leitura, da autonomia dos sujeitos, do fortalecimento dos laços
afetivos e para o desenvolvimento cognitivo por meio da leitura. Como os CAPS também trabalham
no território e em parceria com outras instituições, vale fortalecer a importância de ações para além
dos seus muros e que os outros espaços institucionais não se fechem para esse público. A visita
orientada e a atividade de biblioterapia na BC/UFSC, para esse público específico, são ações
importantes que convergem para a lógica do eixo temático do Congresso Brasileiro de
Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação (CBBD): Ninguém fica para trás.
Compreende-se que a aplicação de atividade de biblioterapia com os usuários dos Centros
de Atenção Psicossocial (CAPS) do Município de Florianópolis favoreceu o bem-estar, motivação
sobre a leitura e interação dos participantes. Pode-se dizer que o uso da linguagem, da fala e da
escuta são recursos importantes para os processos de aprendizagem, produção e socialização do
conhecimento. Esse momento proporcionou a verificação da importância da promoção da leitura e
de ações biblioterapêuticas nos diversos espaços sociais e institucionais.
REFERÊNCIAS
CALDIN, Clarice Fortkamp. Biblioterapia: um cuidado com o ser. São Paulo: Ponto de Ideias, 2010.
CHAGAS, Ricardo de Lima. Rede de bibliotecas em ambientes de saúde mental: um diálogo
interdisciplinar. 2017. 378 p. Dissertação (Mestrado profissional) - Universidade do Estado de Santa
Catarina, Centro de Ciências Humanas e da Educação, Programa de Pós-Graduação em Gestão da
Informação, Florianópolis, 2017.
COMO lidar com seus sentimentos. wikiHow. Disponível em: <https://pt.wikihow.com/Lidar-ComSeus-Sentimentos>. Acesso em: 10 abr. 2018.
PETIT, Michèle. A arte de ler ou como resistir à adversidade. São Paulo: Ed. 34, 2009.
PETIT, Michèle. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva. São Paulo: Ed. 34, 2008.
ROSA, Sonia. O menino Nito. 4. ed. Rio de Janeiro: Pallas, 2011.
SEITZ, Eva Maria. Biblioterapia: uma experiência com pacientes internados em clínicas médicas.
Florianópolis: ACB: Habitus, 2006.
SLAWSKI, Wolfgang. O trem da amizade. São Paulo: Brinque-Book, 1998.
OUAKNIN, Marc-Alain. Biblioterapia. São Paulo: Loyola, 1996.
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Title
A name given to the resource
CBBD - Edição: 28 - Ano: 2019 (Vitória/ES)
Subject
The topic of the resource
Biblioteconomia
Documentação
Ciência da Informação
Publisher
An entity responsible for making the resource available
FEBAB
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2019
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Português
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The nature or genre of the resource
Evento
Coverage
The spatial or temporal topic of the resource, the spatial applicability of the resource, or the jurisdiction under which the resource is relevant
Vitória (Espírito Santo)
Event
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ATIVIDADE DE BIBLIOTERAPIA COM USUÁRIOS DOS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL NA BIBLIOTECA CENTRAL DA UFSC
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Daniella Câmara Pizarro
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Vitória (Espírito Santo)
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FEBAB
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2019
Subject
The topic of the resource
Eixo 2: Não devemos deixar ninguém para trás
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Este trabalho tem como objetivo relatar a experiência vivenciada a partir de uma atividade de biblioterapia realizada na Biblioteca Central da UFSC, com os usuários dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Município de Florianópolis. Essa atividade foi desenvolvida por meio da leitura de duas obras pré-selecionadas: “O trem da amizade” de Wolfgang Slawski e “O menino Nito” de Sonia Rosa. Este relato aponta para a importância da biblioterapia e da leitura como ações que podem proporcionar a catarse e a liberação de emoções e afetos que muitas vezes se encontram reprimidos nos sujeitos. A leitura possibilita a abertura de novos horizontes e permite ao leitor a construção do seu mundo interior como afirmação e empoderamento. O trabalho mostra, também, a importância das ações entre instituições como uma maneira de pensar a saúde mental, o direito ao acesso à informação e a construção de uma sociedade mais equitativa, defendendo a seguinte lógica: ninguém fica para trás.
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