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Relato da experiência: o caso das obras de direitos humanos da
Biblioteca Central da Universidade de Brasília (UnB)
Kathryn Cardim Araujo (UnB) - kathryn.cardim@gmail.com
Ana Regina Luz Lacerda (UnB) - analacerda@bce.unb.br
Diule Vieira de Queiroz (Instituição - a informar) - diulevieira@bce.unb.br
Resumo:
Em 2018, obras danificadas propositalmente foram localizadas por servidores responsáveis
pela circulação de materiais bibliográficos da Universidade de Brasília (UnB). Os livros eram
sobre o fim da ditadura militar e a luta de direitos humanos. O objetivo do relato de
experiência é investigar de como a censura influenciou a formação de acervo da UnB. O
trabalho é baseado em pesquisa bibliográfica sobre o assunto e nos depoimentos dos
profissionais que identificaram as obras danificadas recentemente. Conclui-se que o ato de
vandalismo foi uma manifestação de intolerância e insatisfação com o estabelecimento da
democracia. Trata-se também de uma tentativa de restrição de acesso à informação, ao
impedir que outros usuários acessem as obras. Destaca-se o papel do bibliotecário em
defender e promover os direitos humanos. Além de identificar tentativas de restrição de
acesso à informação, seja essa restrição feita pelos seus gestores, governantes ou usuários.
Palavras-chave: Censura. Biblioteca da Universidade de Brasília. Liberdade de expressão.
Direitos Humanos.
Eixo temático: Eixo 2: Não devemos deixar ninguém para trás
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�XXVIII Congresso Brasileiro de Biblioteconomia e
Documentação
Vitória, 01 a 04 de outubro de 2019.
Introdução
A história de destruição das bibliotecas
A biblioteca reúne em seu acervo a memória cultural de uma comunidade. Se
alguém quer conhecer sobre um povo deve visitar a biblioteca. Lá está a produção
científica, cultural e histórica.
A seleção dos títulos que entram no acervo evidencia o que será transmitido aos
seus descendentes. O que é considerado importante. Assim como o que não entra no acervo
pode demonstrar se talvez a unidade de informação foi alvo de censura ou se teve seus
exemplares eliminados. A classificação bibliográfica mostra como o povo organiza o seu
conhecimento.
No entanto, desde o surgimento das primeiras bibliotecas, percebe-se também o
início da sua depredação. Os motivos são diversos: má conservação das obras, desastres
naturais, acidentes, guerras, censura política e/ou religiosa. Segundo Báez (2006), na sua
obra História da destruição universal dos livros, 60% dos livros desapareceram devido à
destruição voluntária. Não se trata de destruir o objeto. E sim, o que eles representam.
O motivo do fim de muitas bibliotecas foi a conquista de um povo sobre outro
(BÁEZ, 2006). Isso era feito para o povo dominado fosse completamente aniquilado.
Extinguindo a biblioteca de uma sociedade, é como se apagasse o povo da História. Sem
memória e sem patrimônio ninguém existe. Não se sabe para onde vai, quando não se sabe
de onde veio.
O principal motivo que coloca as bibliotecas na linha de frente da disputa por poder é o
fato das mesmas preservarem, em forma de um acervo físico, a memória coletiva e
cultural de um povo. Disputas que, por sua vez, tornam-se as grandes responsáveis pela
perda irrevogável de valiosos tesouros do conhecimento humano. Aquilo que
sobreviveu até os dias atuais é uma amostra ínfima de todo o repertório informacional
que se produziu nos primeiros séculos da humanidade, tendo-se salvado graças aos
esforços individuais de leitores que os conservaram mais ou menos ao acaso.
(SILVEIRA, 2007. p.71)
�A falta de investimento em manutenção das unidades de informação também expõe
as obras ao desgaste. A ação de agentes físicos (criminosos, fogo, água, luz, temperatura,
umidade), agentes biológicos (pragas, ser humano), químicos (poluentes) poderia ser
evitada com aplicação de política de preservação, laboratórios de restauração equipados e
profissionais capacitados na área.
Não se pode atribuir apenas às autoridades a responsabilidade pelo fim das
bibliotecas. Muitos povos não conhecem a sua própria produção cultural. Não frequentam
centros culturais e não exigem do poder público a sua devida manutenção. No Brasil, as
bibliotecas públicas são precárias e sofrem com a falta de recursos.
A censura também foi responsável pela eliminação de livros. Em regimes ditatoriais
há o fim da liberdade de imprensa e o confisco de materiais bibliográficos considerados
“perigosos”. Segundo Reimão (2014) no Brasil, entre 1970 e 1988, aproximadamente 490
livros e 97 revistas foram submetidas à Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP).
De acordo com o Decreto-Lei nº1.077/70, não seriam toleradas obras contrárias à moral e
aos bons costumes.
Vandalismo na Biblioteca da Universidade de Brasília (UnB)
Desde o início de 2018, os servidores responsáveis pela circulação de materiais
bibliográficos da UnB encontraram obras danificadas propositalmente. Os itens tinham em
comum a forma que tinham sido rasgados. E o assunto: o fim da ditadura militar e a luta de
direitos humanos. Ao todo sete livros foram dilacerados.
A direção da biblioteca publicou nota de repúdio sobre o vandalismo e encaminhou
os exemplares à Polícia Federal para investigação. A comunidade universitária respondeu
ao vandalismo com um protesto em frente à unidade de informação em defesa dos direitos
humanos. E com doações de livros sobre o assunto.
Não é a primeira vez que a UnB protagoniza atos de violência contra a liberdade de
informação e expressão. A Universidade sofreu invasão durante a ditadura militar.
Estudantes e professores foram torturados. Alguns estão entre os desaparecidos políticos.
Possuir cópias de textos de Karl Marx era considerado motivo para detenções (FARIA,
2017).
A política de censura determinada pelo Decreto-Lei nº1.077/70 influenciou a
composição do acervo da biblioteca. Muitas obras não entraram no acervo. E outras foram
adquiridas por determinação do governo militar, como por exemplo, os títulos obrigatórios
de disciplinas como “Estudo dos problemas brasileiros”.
�Faria (2017) identificou anotações de usuários em livros sobre a ditadura militar.
São opiniões anônimas de vários leitores diferentes. Algumas opiniões são favoráveis ao
regime, e outras, contra. Criando um verdadeiro debate sobre o tema. Assim, o livro
funciona como “suporte de produção de novas informações, a rede se configura como um
canal de comunicação, produção de sentido, circulação de ideias e opiniões, de modo
horizontal, uma vez que não há hierarquia entre os usuários” (FARIA, 2017)
O autor também observou livros marcados com a suástica. O símbolo nazista foi
registrado em obras publicadas pelo governo militar. Distribuídas nas classes de Ciência
Política, Direito Constitucional e Ditadura - ditadores. As obras foram reclassificadas pelo
usuários como de conteúdo nazista (FARIA, 2017). A biblioteca da UnB “acabou se
tornando uma espécie de arquivo involuntário da ditadura” (FARIA, 2017)
Considerações finais
Desde o início do surgimento das primeiras obras bibliográficas, houve problemas
para preservá-las. As tentativas de apagar a memória dos povos e manipular o que deve ser
lido persiste até hoje. Livros são objetos de poder porque são capazes transformar pessoas.
Os ataques aos itens bibliográficos ao longo da História da humanidade foram feitos não
apenas por aqueles que estavam no poder, mas também por usuários. Porque consideram
que o conteúdo dos livros não está de acordo com as suas ideias.
No artigo 19º da Declaração Universal de Direitos Humanos cita “Todo o indivíduo
tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser
inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de
fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão.” A responsabilidade das
unidades de informação é garantir o livre acesso a informação de forma democrática.
Portanto, a biblioteca deve identificar tentativas de restrição de acesso à informação. Seja
essa restrição feita pelos seus gestores, governantes ou usuários.
Sabemos que o Brasil viveu um período difícil de repressão, perseguição política e
censura. E que deixou marcas profundas na nossa História. O crime ocorrido na UnB é
consequência desse período. Restringir a informação era uma forma de controle social. O
autor do crime sabe que não eliminará todos os livros de direitos humanos. Os exemplares
destruídos estão disponíveis em outras bibliotecas, livrarias e há inúmeras publicações
sobre o tema na Internet. Trata-se de uma demonstração de ódio pelas conquistas dos
direitos humanos. Livros rasgados representam mais que uma lesão ao patrimônio público.
É uma ofensa a nossa memória. O criminoso revela a sua intolerância e a sua insatisfação
com o estabelecimento da democracia.
�A UnB já foi alvo de repressão durante a ditadura militar e recentemente reviveu
atos de intolerância. Cabe não só aos bibliotecários, mas toda sociedade brasileira está
atenta a manutenção das unidades de informação para que esse lugar seja propício à correta
liberdade de expressão e de informação.
Referências
BÁEZ, Fernando. História universal da destruição dos livros. Rio de Janeiro: Ediouro,
2006.
FARIA, Daniel Barbosa Andrade de. Paisagem de cacos e dores revoltadas: as marginalias
da ditadura em livros de uma biblioteca universitária. Revista Tempo e Argumento,
Florianópolis, v. 9, n. 21, p. 243 - 289, maio/ago. 2017. Disponível em:
http://www.revistas.udesc.br/index.php/tempo/article/viewFile/2175180309212017243/700
8. Acesso em: 15 abr. 2019.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração Universal do Direitos
Humanos. Disponível em:
https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf. Acesso em: 19
abr. 2019.
REIMÃO, Sandra. “Proíbo a publicação e circulação…” - censura a livros na ditadura
militar. Estudos Avançados, São Paulo, v. 28, n. 80, jan/abr, 2014. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40142014000100008&script=sci_arttext.
Acesso em: 15 abr. 2019.
SILVEIRA, Fabrício José Nascimento da. Biblioteca como lugar de práticas culturais:
uma discussão a partir dos currículos de Biblioteconomia no Brasil. 2007. Dissertação
(Mestrado em Ciência da Informação) - Escola de Ciência da Informação, Universidade
Federal de Minas Gerais, Minas Gerais, 2007.
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Dublin Core
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Title
A name given to the resource
CBBD - Edição: 28 - Ano: 2019 (Vitória/ES)
Subject
The topic of the resource
Biblioteconomia
Documentação
Ciência da Informação
Publisher
An entity responsible for making the resource available
FEBAB
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2019
Language
A language of the resource
Português
Type
The nature or genre of the resource
Evento
Coverage
The spatial or temporal topic of the resource, the spatial applicability of the resource, or the jurisdiction under which the resource is relevant
Vitória (Espírito Santo)
Event
A non-persistent, time-based occurrence. Metadata for an event provides descriptive information that is the basis for discovery of the purpose, location, duration, and responsible agents associated with an event. Examples include an exhibition, webcast, conference, workshop, open day, performance, battle, trial, wedding, tea party, conflagration.
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A name given to the resource
Relato da experiência: o caso das obras de direitos humanos da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (UnB)
Creator
An entity primarily responsible for making the resource
Kathryn Cardim Araujo
Ana Regina Luz Lacerda
Diule Vieira de Queiroz
Coverage
The spatial or temporal topic of the resource, the spatial applicability of the resource, or the jurisdiction under which the resource is relevant
Vitória (Espírito Santo)
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FEBAB
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2019
Subject
The topic of the resource
Eixo 2: Não devemos deixar ninguém para trás
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An account of the resource
Em 2018, obras danificadas propositalmente foram localizadas por servidores responsáveis pela circulação de materiais bibliográficos da Universidade de Brasília (UnB). Os livros eram sobre o fim da ditadura militar e a luta de direitos humanos. O objetivo do relato de experiência é investigar de como a censura influenciou a formação de acervo da UnB. O trabalho é baseado em pesquisa bibliográfica sobre o assunto e nos depoimentos dos profissionais que identificaram as obras danificadas recentemente. Conclui-se que o ato de vandalismo foi uma manifestação de intolerância e insatisfação com o estabelecimento da democracia. Trata-se também de uma tentativa de restrição de acesso à informação, ao impedir que outros usuários acessem as obras. Destaca-se o papel do bibliotecário em defender e promover os direitos humanos. Além de identificar tentativas de restrição de acesso à informação, seja essa restrição feita pelos seus gestores, governantes ou usuários.
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