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O QUE FAZ A DIFERENÇA PARA O DOMÍNIO DO CONHECIMENTO?
LEITURA, BIBLIOTECA E LETRAMENTO INFORMACIONAL
Eixo temático n.º 08: Desenvolvendo a Information Literacy.
Aida Varela Varela
Professor-Adjunto II do Instituto de Ciência da Informação / Universidade Federal da
Bahia. Campus Universitário do Canela, s/n.º, Canela, CEP: 40110-100, tel.: 713336-6755, Salvador, Bahia, Brasil. Especialista na Teoria da Modificabilidade
Cognitiva Estrutural (TMCE) pelo ICELP/Israel. Especialista em Educação de Adultos
e Ensino à Distância pela British Columbia – Vancouver/Canadá. Mestrado e
Doutorado em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília (UnB).
e-mail: varela1946@hotmail.com / varela@ufba.br
RESUMO
Neste artigo, analisamos a necessidade do letramento informacional para a
apreensão e construção do conhecimento científico no Ensino Superior, num
contexto de sociedade cognitiva e tecnológica que desafia o sujeito a incluir-se
socialmente e a realizar-se individualmente. A ênfase recai sobre os estudos e
pesquisas que avaliam as dificuldades encontradas pelos alunos do Ensino Médio e
do Ensino Superior no domínio da leitura, especialmente em relação às
competências de crítica e significação. O que se infere é a desvinculação entre a
formação de professores e a formação de bibliotecários no que tange à urgente
tarefa de fortalecimento do movimento Information Literacy e Information Literacy
Education.
Palavras-chave: Information Literacy, Competências e Habilidades, Leitura.
ABSTRACT
In this article, we analyze the necessity of the Information Literacy for the
apprehension and construction of the scientific knowledge at the University, living in a
cognitive and technological society that provokes the subject to include itself socially
and to becomes fullfilled itself individually. The emphasis falls on the studies and
researchs that evaluate the High School and Universitarian students difficulties in the
domain of reading, especially in relation to the critical and signitificative abilities. What
it is inferred is the disentail between the teacheres formation and the librarians
formation in relationship at the urgent task of encouragement of the Information
Literacy and Information Literacy Education movement.
Key-words: Information Literacy, Competences and Abilities, Reading.
1
�1. Introdução
Assiste-se a uma crescente valorização dos pressupostos da chamada
sociedade cognitiva, sociedade que estimula o sujeito a desenvolver, continuamente,
conhecimentos, capacidades e atitudes, assumindo, como principal desafio, reduzir
as diferenças entre aqueles que sabem aprender e os que não o sabem.
A Universidade, na qualidade de centro autônomo de pesquisa e de criação
do saber, é responsável pelo cumprimento da missão do ensino superior e pela
difusão dos seus valores fundamentais. Para a consecução de suas finalidades
educativas, a Universidade busca reforçar o seu papel de instituição social,
procurando implementar ações que contribuam para a formação de cidadãos
capazes de atuar, competentemente, no seu contexto social, com o compromisso de
construir uma sociedade solidária e ética.
No Brasil, a Legislação da Educação Superior, referendada pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), n.º 9.394/96, insere uma nova
concepção curricular que confere maior autonomia didático-científica à Universidade,
ratificado pelo Sistema Nacional de Avaliação que orienta a demanda, pressionando
as instituições universitárias e, por conseqüência, os professores do Ensino Superior,
a seguir os ditames internacionais.
Ao se observar o cenário a ser enfrentado pelos egressos da educação
superior, percebe-se uma necessidade crescente de adaptabilidade às novas
exigências de uma realidade em permanente mudança ao enfrentar novos tipos de
problema que envolvem novos recursos tecnológicos, o que torna imprescindível o
comunicar-se de forma eficaz, utilizando-se do raciocínio crítico, do processamento e
reelaboração da informação recebida, gerando soluções originais, conscientizandose de seus próprios processos cognitivos.
Segundo estudos e pesquisas apresentadas por instituições brasileiras e
organizações mundiais, o ensino médio, no Brasil, pré-requisito para o Ensino
Superior, apresenta resultados que levam a concluir que, no processo de letramento
informacional, há fragilidades ainda na organização, disseminação da informação e
2
�no domínio das competências de transferência e transcendência para a construção
do conhecimento, não havendo espaço, portanto, para o pensamento divergente.
Reconhecendo-se a força da informação e sua disseminação para a
transformação do ser humano e do seu entorno, reconhecendo-se o espaço que vem
ganhando, na sociedade, o movimento Information Literacy e o Information Literacy
Education, este artigo se propõe a apresentar algumas entidades avaliadoras e
pesquisas acadêmicas sobre o desempenho da leitura dos potenciais alunos do
curso superior, a partir da análise da relação entre fontes, fluxo e disseminação da
informação, e do estudo de causas e efeitos da baixa proficiência em leitura como
impasse para o acesso ao conhecimento científico com criticidade.
2. Leitura: estudos e pesquisas.
Os interesses em realizar estudos de avaliação são diversos e constantes.
No governo, esses estudos estão diretamente ligados à efetividade, eficiência,
accountability e, mais amplamente, ao desempenho da Gestão Pública. Já na esfera
da Universidade, a preocupação reside no estudo e debate de teorias educacionais e
práticas pedagógicas que permeiam as formas de produção e construção do
conhecimento na contemporaneidade. Entre os estudos avaliativos sobre proficiência
em leitura, destacam-se: Proposta de Avaliação do Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), Proposta do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) e
Estudos e Pesquisas Acadêmicas em Educação e Leitura.
2.1. Proposta de Avaliação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM)
Relatórios 2001 a 2005.
O ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio –, promovido pelo INEP –
Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira –, é
realizado anualmente, desde 1998, com o objetivo de avaliar o desempenho do aluno
3
�ao término da escolaridade básica, para aferir o desenvolvimento de competências
fundamentais ao exercício pleno da cidadania.
Na parte objetiva do exame, são propostas ao participante situaçõesproblema originais devidamente contextualizadas na interdisciplinaridade das
ciências, das artes e da filosofia, articuladas com o mundo em que vivemos. Utilizamse dados, gráficos, figuras, textos, referências artísticas, charges, algoritmos,
desenhos, ou seja, todas as linguagens possíveis para veicular dados e informações.
Quanto à outra parte do Exame – a redação –, tem sido elaborada de forma a
possibilitar que o participante, a partir de subsídios oferecidos, realize uma reflexão
escrita sobre um tema de ordem política, social, cultural ou científica.
O ENEM, quanto às exigências de competências em leitura, avalia o domínio
de linguagens sem fronteiras de códigos lingüísticos, a interpretação de textos na
dimensão de conjunturas, proposições e símbolos, a realização de operações que
possibilitem ultrapassar uma dada situação ou problema chegando à sua conclusão,
o recorte significativo de uma realidade às vezes complexa, a coordenação de
pontos de vista em favor de uma meta, a análise de situações anteriores para definir
ou redimensionar as seguintes.
Os resultados do ENEM, disseminados pelo MEC / SAEB, reforçam a
necessidade de estudos e atitudes que otimizem o letramento informacional para a
leitura, fortalecendo, assim, no Ensino Superior, o ato de ler. Apresenta, ainda, as
diferenças associadas à escola pública e à escola particular, a última com índices
mais altos que os da escola pública. Destacam-se as médias associadas à
escolaridade do pai e da mãe e à faixa de renda familiar. As médias mais baixas,
localizadas na escola pública, estão articuladas à ausência de escolaridade dos pais
e às mais baixas faixas de renda familiar de um salário mínimo, inferindo-se que a
desigualdade de letramento familiar e conseqüente falta de acesso à informação
reflete-se no grau de proficiência cognitiva dos alunos.
Eis
algumas
considerações
quanto
ao
domínio
de
competências
selecionadas pelo Exame, tomando-se como referência os resultados de 2002, num
universo de 1.318.820 participantes (sendo 50,2% da Região Sudeste, 26,6% da
4
�Região Nordeste e 10,8%, 5% e 7,4% das regiões Sul, Norte e Centro-Oeste,
respectivamente):
Dominar a norma culta da Língua Portuguesa e fazer uso das
linguagens matemática, artística e científica – 1,75% dos alunos situaram-se no
grupo de desempenho considerado entre insuficiente e regular, 47,37% dos alunos
situaram-se no grupo de desempenho considerado entre regular e bom e 50,88%
dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado entre bom e
excelente.
Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a
compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da
produção tecnológica e das manifestações artísticas – 3,51% dos alunos
situaram-se no grupo de desempenho considerado entre insuficiente e regular,
52,63% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado entre regular
e bom e 43,86% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado entre
bom e excelente.
Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações
representados de diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situaçõesproblema – 7,02% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado
entre insuficiente e regular, 59,65% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho
considerado entre regular e bom e 33,33% dos alunos situaram-se no grupo de
desempenho considerado entre bom e excelente.
Relacionar informações, representadas em diferentes formas, e
conhecimentos
disponíveis
em
situações
concretas,
para
construir
argumentação consistente – 5,26% dos alunos situaram-se no grupo de
desempenho considerado entre insuficiente e regular, 54,39% dos alunos situaramse no grupo de desempenho considerado entre regular e bom e 40,35% dos alunos
situaram-se no grupo de desempenho considerado entre bom e excelente.
Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração
de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os valores
humanos e considerando a diversidade sociocultural – 0,00% dos alunos
situaram-se no grupo de desempenho considerado entre insuficiente e regular,
5
�50,88% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado entre regular
e bom e 49,12% dos alunos situaram-se no grupo de desempenho considerado entre
bom e excelente.
Diante dos resultados apresentados, percebe-se que, à medida que aumenta
a complexidade das operações cognitivas, a exemplo do raciocínio hipotéticodedutivo e do inferencial para o estabelecimento de relações de causa e efeito em
prol da organização da informação, objetividade e clareza nas organizações, há um
decréscimo no percentual de desempenho bom e excelente.
Segundo as considerações pedagógicas sobre o ENEM 2001 e 2002,
“a ausência do domínio de leitura compreensiva foi a causa principal
de situar-se o desempenho dos participantes do ENEM entre
insuficiente e regular, visto que a leitura compreensiva é um processo
global difuso, intrinsecamente ligado às intenções do participante
(leitor), dos professores autores das situações-problema, e ao
contexto sociohistórico em que tanto o autor quanto o leitor estão
imersos.
Compreender o texto das situações-problema do ENEM não é retirar
quase que “fotograficamente” a resposta para o problema. O
participante precisa construir um modelo mental da situação descrita,
e isso requer uma série de habilidades anteriores: o reconhecimento
de palavras, o entendimento das relações gramaticais e semânticas
entre palavras e a integração das idéias e conceitos por meio de
inferências.
As inferências intra-sentenciais exigem a associação das informações
que se encontram no texto da situação-problema; as inferências
pragmáticas necessitam de conhecimentos previamente construídos;
e as inferências avaliativas exigem posicionamentos pessoais e
envolvem valores. A leitura compreensiva é, portanto, um processo de
integração e construção de significados.
Aliada à não assimilação de conteúdos básicos próprios, em sua
maioria, ao ensino fundamental, a leitura superficial e fragmentada
parece ter acarretado escolhas equivocadas de resposta na parte
objetiva da prova e, na redação, resultou na elaboração de textos
que, embora adequados ao tema proposto, apresentaram problemas
na sua estruturação, em que pesem os poucos excelentes registros
de desempenho nesta parte da prova.”
(Fonte: Relatórios Finais ENEM, 2001 e 2002)
No que se refere ao ENEM 2003, que integrou o universo de 22.000 escolas
com oferta de 3ª série do Ensino Médio, em todo o Brasil, não houve grandes
diferenças do perfil socioeconômico de 2002. A faixa etária dos jovens que fizeram o
exame em 2003, a sua grande maioria do sexo feminino, está situada no intervalo
entre 17 e 21 anos (78,7%). Do ponto de vista étnico, o ENEM 2003 também espelha
6
�a diversidade social brasileira, com 41,4% de autodeclarados negros ou pardos e
mulatos. Ao analisar as médias das competências dos candidatos na redação,
verificou-se que o pior desempenho ocorreu na competência V: “elaborar proposta de
intervenção para o problema abordado, demonstrando respeito aos direitos
humanos”.
Os documentos mais recentes sobre o ENEM, 2004 e 2005, registram que o
referido exame ganhou, desde 2004, uma maior dimensão social. Com sua
vinculação ao Programa Universidade para Todos (ProUni), do MEC, o ENEM
possibilita a estudantes de escola pública bolsas para cursar o ensino superior.
Espera-se que em 2005 o exame chegue a 727 municípios em 27 unidades da
Federação, e que, além de promover a necessária identificação de competências e
habilidades de seus participantes, ajude na justa distribuição de bolsas de estudo no
ensino superior.
Comprova-se que, apesar do empenho do MEC em avaliar e, assim,
estimular projetos de intervenção para incrementar o desenvolvimento de
competências e habilidades de leitura na Educação Básica, um percentual
significativo de estudantes ingressa na educação superior sem o devido
desenvolvimento de funções e operações cognitivas para o ato de ler, não podendo o
estudo universitário avançar no conhecimento específico necessário para a formação
profissional.
2.2. PISA – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes
O PISA – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – da OCDE –
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – foi criado para
avaliar o grau de domínio em competências e habilidades dos jovens que estão
prestes a concluir a escolaridade e enfrentar os desafios das sociedades atuais, em
torno de três domínios: letramento em Matemática, letramento em Leitura e
letramento em Ciências.
Segundo estudiosos do PISA, 2000 (letramento em Leitura), um fator
importante para a compreensão em leitura é a quantidade de tempo que os
7
�estudantes gastam lendo. Se os estudantes lêem bem, tendem a ler mais e,
conseqüentemente, adquirem mais conhecimentos
em todos os domínios.
Estudantes que têm hábitos deficientes de leitura freqüentemente acham que o
material de leitura é difícil demais, portanto, desenvolvem uma atitude negativa em
relação à leitura, acabam entrando em um círculo vicioso, uma vez que, por lerem
menos, têm menos oportunidade de desenvolver estratégias de compreensão da
leitura, e, dessa forma, ficam defasados em todas as disciplinas, já que a leitura é
necessária para todas as áreas acadêmicas.
Na tentativa de simular situações autênticas de leitura, a avaliação de leitura
do PISA (2000) mede os cinco seguintes aspectos associados à compreensão
integral de um texto, seja este contínuo ou não-contínuo: construir uma compreensão
geral ampla, recuperar informações, desenvolver uma interpretação, refletir sobre o
conteúdo de um texto e avaliá-lo e refletir sobre a forma de um texto e avaliá-la.
Embora haja uma relação entre os cinco aspectos – todos eles podem,
individualmente, exigir muitas das mesmas habilidades subjacentes –, o sucesso em
um deles pode não ser dependente do sucesso em qualquer outro. Há quem acredite
que estes aspectos estão no repertório do leitor em cada nível de desenvolvimento,
ao invés de constituir uma hierarquia seqüencial ou um conjunto de habilidades.
Em relação aos níveis de proficiência no letramento em leitura, foi registrado
que, em parte, as dificuldades são determinadas pela extensão, pela estrutura e pela
complexidade do próprio texto. No entanto, notaram também que, na maioria das
unidades de leitura, as questões ou instruções variam ao longo da escala de
letramento em leitura. Isso significa que, embora a estrutura de um texto contribua
para a dificuldade de um item, o que o leitor precisa fazer com o texto, definido pela
questão ou instrução, afeta a dificuldade total da tarefa (PISA, 2000).
Foram
identificadas
diversas
variáveis
que
podem
influenciar
nas
dificuldades de qualquer tarefa de letramento informacional para a leitura. O tipo de
processo
envolvido
em
recuperação
de
informações,
desenvolvimento
de
interpretação ou reflexão sobre o que foi lido é um dos fatores relevantes. Os
processos variam em complexidade e sofisticação, desde conexões simples entre
itens de informação até categorização de idéias de acordo com determinados
8
�critérios, e avaliação crítica ou formulação de hipóteses sobre uma parte do texto.
Além do tipo de processo evocado, a dificuldade de tarefas de recuperação de
informações está associada ao número de informações a serem incluídas na
resposta, ao número de critérios aos quais a informação obtida deve satisfazer, e ao
fato de a informação recuperada precisar ou não ser seqüenciada de determinada
forma. No caso de tarefas de interpretação e de reflexão, um fator importante que
afeta a dificuldade é a quantidade de texto que precisa ser assimilada. Em itens que
requerem reflexão por parte do leitor, a dificuldade é condicionada também pela
familiaridade ou especificidade do conhecimento que precisa ser trazido de fora do
texto. Em todos os aspectos da leitura, a dificuldade da tarefa depende de quão
proeminente é a informação requerida, de quantas informações concorrentes são
apresentadas, e do fato de as idéias ou as informações necessárias para a
realização da tarefa estarem ou não explicitamente expressas (PISA, 2000).
2.3. Estudos e Pesquisas Acadêmicas
Profissionais de diferentes áreas de formação e de campos de atuação
distintos têm-se preocupado com a questão da leitura, o que, por sua vez, leva-os a
repensar a relação entre conhecimento e uso do código alfabético, uso e funções da
palavra escrita nas interações sociais – processo de letramento. O interesse pela
questão leva-os, também, a refletir sobre quais seriam as práticas de ensinoaprendizagem que possibilitariam ao aluno oportunidades de, mais do que conhecer
o código, incrementar a palavra escrita em sua vida, em diferentes situações de
interação.
O crescimento na quantidade de dissertações de mestrado e de teses
defendidas sobre leitura torna-se significativo nas duas últimas décadas, quando já
se localizam 227 trabalhos, no período de 1980-1995, e um outro conjunto de 181
pesquisas em apenas cinco anos, de 1996 a 2000, conforme quadro a seguir:
Quadro 1: Número de pesquisas distribuídas em períodos – Brasil, 1965/2000
1965-1979 1980-1985
22
43
1986-1990
70
1991-1995
114
1996-2000
181
S/D
01
TOTAL
431
9
�(Fonte: FERREIRA, 2004)
Atualmente, o conceito de letramento desmistifica a divisão leitores e nãoleitores, questiona as leituras legitimadas pela tradição cultural associada a
determinados objetos, formas, lugares e modelos de leitor e traz em seu bojo as
pesquisas que tematizam a leitura. O letramento tem sido, assim, no interior da
produção acadêmica, um termo que ora substitui, ora amplia, ora se contrapõe ao
conceito de leitura.
O foco de interesse dos pesquisadores se volta para descrever, entender e
recuperar os elementos cognitivos, a dimensão interior desta experiência na
relação/atividade do leitor com o material dado a ler. Como se lê? Que habilidades ou
competências são necessárias para a leitura significativa e crítica? Quais são as
dificuldades de leitura? Como processar o entendimento de textos dos mais simples
para os mais complexos? (Ferreira, 2004).
Um grupo de 104 dissertações de mestrado e teses de doutorado volta-se
para instituições importantes na formação de leitores: a escola e a biblioteca. As
pesquisas denunciam que a escola e a biblioteca têm falhado em sua função de
formar leitores. Falhado pela ausência de atualização desses profissionais na área
da leitura, pela falta de um acervo de livros compatível com as necessidades,
interesses, expectativas de seus leitores e pela ausência de propostas pedagógicas
mais eficientes, dinâmicas e atualizadas para as mudanças da sociedade
(FERREIRA, 2000).
Nos meados da década de 80, nos relatos de propostas lúdico-pedagógicas
e de críticas aos métodos tradicionais no ensino da leitura, um conjunto de
dissertações e de teses constrói uma outra idéia da leitura, vinculada ao prazer e ao
lazer, ancorada no conhecimento das preferências dos alunos, na facilidade de
acesso aos livros, na substituição do imperativo da disciplina e da obrigatoriedade
pela motivação, interesse e criatividade. É a leitura pelo prazer, o gosto de ler, a
liberdade de escolher aquilo de que gosta.
Ainda na década de 80, um grupo que reúne 48 trabalhos, indaga: Que leitor
é esse que passa pelas bibliotecas públicas e escolares, que se sujeita a diferentes
10
�propostas pedagógicas, que é examinado em grupos de controle em diferentes
situações de leitura?
As primeiras pesquisas apontam para um leitor mapeado, identificado por
sua classe social, econômica, escolar, faixa etária, fatores que interferem na
produção dos interesses, das preferências, dos hábitos e gostos pela leitura. Os
meninos preferem aventura, as meninas, romances; os alunos mais novos,
iniciantes, livros com muitas figuras; os não familiarizados com a cultura escrita ou
aqueles de classes mais populares preferem histórias adaptadas e modernizadas
dos clássicos.
Outras pesquisas, já na década de 90, olham para esse leitor e buscam
conhecê-lo pela sua história de leitura, pelas experiências vividas no interior da
escola e fora dela. Relativiza-se, neste caso, a responsabilidade da escola e da
biblioteca que oferecem alguns modos de ler e algumas habilidades. A leitura passa
a ser entendida como uma prática social e não apenas escolarizada. As pesquisas
buscavam imagens e representações construídas socialmente pelos sujeitos acerca
da leitura, através de depoimentos, relatos, histórias de vida e de leitura, estudos de
caso. Recentemente, alguns trabalhos voltam-se às práticas sociais de leitura ligadas
a determinadas comunidades de leitores: leitura feminina de romances sentimentais
de massa, como as leitoras da série Sabrina, leitores de Role Plaing Games (RPG),
leitores de assentamentos, leitores universitários.
Na discussão sobre o leitor, há um leitor muito especial, destacado nas
pesquisas: o professor leitor, investigado em 35 trabalhos que trazem suas histórias
de leitura, seus depoimentos de vida pessoal e profissional, buscando equacionar
sua formação como leitor, conhecer suas práticas, modos de ver e de sentir a leitura,
os livros. As pesquisas apontam para um professor marcado pelo desprestígio social
da profissão, pelo seu exíguo salário, pelo seu tempo escasso, por não apresentar as
mínimas condições de ser leitor.
Partindo de um modelo de leitor ideal (aquele que lê muito, sistemática e
freqüentemente, obras de literatura normalmente clássicas e legitimadas pela
academia, aquele que assina e lê jornais de grande circulação e revistas
especializadas), os trabalhos denunciam a ausência de leitura por parte do professor.
11
�Quanto ao professor em formação, os pesquisadores mostram-se preocupados em
equacionar os currículos dos cursos de graduação, bem como a inclusão de
disciplinas que possam assegurar a produção de "novos" conhecimentos, ainda
durante seu processo de formação inicial, capacitando esse formando para que ele
possa contribuir com a importante função social da escola – formar leitores.
3. Conclusão
Que lugar é reservado ao leitor para o fortalecimento do letramento
informacional para o desenvolvimento de habilidades de leitura compreensiva e
crítica nos cursos universitários? Formam-se leitores ou, ao contrário, instala-se ou
reforça-se o “desgosto” pela leitura?
O fato é que investigar a relação entre alfabetização e letramento, entre
conhecimento do código e prática, implica em revisão e redimensionamento de
vários outros conceitos: o de ler e escrever, o de língua escrita e de língua falada, o
de práticas orais e de práticas escriturais de produção de textos. Essa postura exige,
também, obviamente, que se repense o que é ensinar/aprender uma língua e seus
usos.
Que prática ou práticas pedagógicas desenvolvem habilidades para
investigar e diagnosticar os problemas que afetam o usuário quanto à aquisição do
conhecimento? Como objetivar a formação de um “gestor da informação” com atitude
investigativa?
Com a finalidade de selecionar conteúdo e textos que atendessem às
necessidades informacionais e raciocínios exigidos pelo Ensino Superior, era
necessário, inicialmente, delinear o perfil dos alunos que ingressavam ao primeiro
semestre do Instituto de Ciência da Informação (ICI) da Universidade Federal da
Bahia (UFBa).
Após aplicação de questionário a 60 alunos de 03 turmas de Graduação em
Biblioteconomia e em Arquivologia que lecionava no semestre 2005.2, delineou-se o
seguinte perfil: maioria do sexo feminino (78,4%); estudantes de Biblioteconomia
(62,7%) e de Arquivologia (37,3%); motivo da escolha do curso: oportunidade
12
�(47,0%), gosto pela profissão (21,6%) outros motivos (31,4%); tipo de escola em que
concluiu o Ensino Médio: escola pública (82,4%); participantes do ENEM (39,2%);
escolaridade do pai: Ensino Médio completo (33,3%), 1ª a 4ª série do Ensino
Fundamental (19,6%), Ensino Médio incompleto (19,6%); escolaridade da mãe: 1ª a
4ª série do Ensino Fundamental (29,4%), Ensino Médio completo (27,6%), 5ª a 8ª
série do Ensino Fundamental (21,5%); dos respondentes, 96,1% declararam que
gostam de ler; a freqüência que o aluno dedica à leitura: quase todos os dias
(66,6%), uma ou duas vezes por semana (23,5%); tempo que o aluno dedica à leitura
diariamente: entre uma e duas horas (49,0%), entre meia e uma hora (37,3%);
quanto ao que costuma ler: livro didático – sempre (56,8%), às vezes (41,2%); jornais
– sempre (60,8%), às vezes (35,3%); revistas de informação – sempre (64,7%), às
vezes (35,3%); revistas de humor – às vezes (58,5%), nunca (41,2%); revistas
científicas – sempre (45,1%), às vezes (39,2%), nunca (15,7%); romances – sempre
(31,4%), às vezes (52,9%), nunca (15,7%); quanto a dificuldades de leitura, os
alunos, mesmo registrando não ter dificuldade em analisar o texto, sintetizar o texto,
detectar idéias principais do texto, relacionar o conteúdo do texto com outros
conteúdos estudados e compreender diferentes códigos de linguagem existentes no
texto (escrita, gráficos, ilustrações, figuras, tabelas etc), 56,9% afirmaram ter
dificuldade em organizar dados e informações para argumentar. Entre as sugestões
de estratégias para os professores ajudarem os alunos na melhoria do grau de
proficiência em leitura, estão: inovar metodologias de orientação para leitura, a
exemplo de oficinas de leitura e de elaboração de textos (37,2%), discutir textos em
grupo (29,4%), selecionar textos mais interessantes (23,5%), estimular a organização
de grupos de leitura (17,6%), intensificar atividades de interpretação de texto e
debates (15,7%).
O perfil da clientela caracterizou-se por estudantes que chegaram ao Curso
de Biblioteconomia e de Arquivologia por acaso, por oportunidade, oriundos do
Ensino Médio de Escola Pública, com escolaridade dos pais focada no Ensino Médio,
estudantes que declaram gostar de ler e não ter dificuldade de leitura, contudo, isso
não está refletido nos dados coletados em relação à freqüência de leitura, no tempo
dedicado à leitura, no que costumam ler, na dificuldade de leitura registrada –
13
�“organizar dados e informações para argumentar” – e nas sugestões apresentadas
para melhorar o grau de proficiência em leitura.
Infere-se, portanto, que as turmas consultadas não cheguem, com facilidade,
à leitura de textos científicos complexos, o que é testemunhado, cotidianamente,
durante as aulas, em atividades de leitura, de apresentações orais e escritas, e, entre
outros aspectos, não dominam a expressão oral e escrita da língua, exibem
dificuldades na construção de argumentos, em resumir e sintetizar, em detectar e
resolver situações-problema, estabelecer relações, tudo isso aliado à falta de
técnicas alternativas para estudar, além de demonstrar baixa estima quanto às
próprias potencialidades e habilidades. As evidências mostram a necessidade do
desenvolvimento de esquemas intelectuais necessários à abstração e estratégias de
aprendizagem que subsidie o aluno em solucionar situações-problema.
Nesse novo cenário, tem sido repensada a prática pedagógica em todos os
níveis. No ensino superior, é preciso formar jovens com autonomia intelectual, com
paixão pela busca do conhecimento, com postura ética, comprometidos com os
destinos da sociedade humana.
O desafio que se coloca, neste início de século, diante do uso extensivo das
tecnologias da informação e da viabilização de condições para que as pessoas
compartilhem os significados que podem ser atribuídos às informações – a
construção de conhecimento significativo
–, é o de que as instituições responsáveis
pela disseminação de conteúdos transformem-se em comunidades dedicadas à
construção coletiva de significados, passem de meros intermediários do processo de
aquisição da informação à construtores do conhecimento. Para tanto, delineia-se
uma mudança de paradigma, um modelo centrado no sujeito/usuário voltado para o
aprendizado como processo contínuo de internalização de fundamentos conceituais,
atitudinais, comportamentais e de habilidades necessárias à compreensão e
interação permanente com o universo informacional e sua dinâmica – Information
Literacy –, quando professores e bibliotecários integram-se em prol do fortalecimento
da apreensão e da construção do conhecimento científico.
14
�REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, M.; CASTRO, M. Ensino Médio: Múltiplas Vozes. Brasília: UNESCO,
MEC, 2003.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
Instituto Nacional de Exames e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame
Nacional do Ensino Médio : Documento Básico. Brasília, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
Parâmetros curriculares nacionais – ensino médio: bases legais. Brasília, 1999.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
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Dublin Core
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Title
A name given to the resource
SNBU - Edição: 14 - Ano: 2006 (UFBA - Salvador/BA)
Subject
The topic of the resource
Biblioteconomia
Documentação
Ciência da Informação
Bibliotecas Universitárias
Description
An account of the resource
Tema: Acesso livre à informação científica e bibliotecas universitárias.
Creator
An entity primarily responsible for making the resource
SNBU - Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias
Publisher
An entity responsible for making the resource available
UFBA
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2006
Language
A language of the resource
Português
Type
The nature or genre of the resource
Evento
Coverage
The spatial or temporal topic of the resource, the spatial applicability of the resource, or the jurisdiction under which the resource is relevant
Salvador (Bahia)
Event
A non-persistent, time-based occurrence. Metadata for an event provides descriptive information that is the basis for discovery of the purpose, location, duration, and responsible agents associated with an event. Examples include an exhibition, webcast, conference, workshop, open day, performance, battle, trial, wedding, tea party, conflagration.
Dublin Core
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Title
A name given to the resource
O que faz a diferença para o domínio do conhecimento? Leitura, biblioteca e letramento informacional.
Creator
An entity primarily responsible for making the resource
Varela, Aida Varela
Coverage
The spatial or temporal topic of the resource, the spatial applicability of the resource, or the jurisdiction under which the resource is relevant
Salvador (Bahia)
Publisher
An entity responsible for making the resource available
UFBA
Date
A point or period of time associated with an event in the lifecycle of the resource
2006
Type
The nature or genre of the resource
Evento
Description
An account of the resource
Neste artigo, analisamos a necessidade do letramento informacional para a apreensão e construção do conhecimento científico no Ensino Superior, num contexto de sociedade cognitiva e tecnológica que desafia o sujeito a incluir-se socialmente e a realizar-se individualmente. A ênfase recai sobre os estudos e pesquisas que avaliam as dificuldades encontradas pelos alunos do Ensino Médio e do Ensino Superior no domínio da leitura, especialmente em relação às competências de crítica e significação. O que se infere é a desvinculação entre a formação de professores e a formação de bibliotecários no que tange à urgente tarefa de fortalecimento do movimento Information Literacy e Information Literacy Education.
Language
A language of the resource
pt